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ONU respalda uso de transgênicos no combate à fome
A biotecnologia representa grande esperança para agricultores de países em
desenvolvimento, mas, até agora, apenas algumas dessas nações estão
desfrutando de seus benefícios. A análise está no relatório anual da
Organização para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês) da ONU,
divulgado nesta segunda-feira.
Numa clara defesa da adoção de alimentos transgênicos como uma das formas de
combate à fome mundial, a FAO alerta para o fato de que cultivos
considerados essenciais sobretudo nos países mais pobres - como mandioca,
batata e trigo - vêm sendo negligenciados por cientistas. O documento lembra
que o mundo terá 2 bilhões de pessoas a mais para alimentar até 2030 e que a
biotecnologia pode ajudar a enfrentar tal desafio.
'Nem o setor público nem o privado investem significativamente em novas
tecnologias genéticas para os chamados 'cultivares órfãos', como o sorgo e o
painço, essenciais para os povos mais pobres do planeta', afirmou o
diretor-geral da FAO, Jacques Diouf.
'Transgênicos são seguros', diz documento
A posição da FAO vai de encontro às teses mais difundidas, segundo as quais
o problema da fome não está relacionado à escassez de alimentos, mas sim à
má distribuição. O documento frisa que o grande desafio da biotecnologia é
desenvolver técnicas que combinem o aumento da produção, a redução dos
custos, a proteção do meio ambiente e, ainda, garantam a segurança
alimentar.
Embora o documento sustente que a biotecnologia não se restringe aos
transgênicos, o texto cita o que considera organismos geneticamente
modificados bem-sucedidos: 'Exemplos são encontrados em variedades de arroz
e canola que contêm consideráveis quantidades de betacaroteno. Esse
precursor da vitamina A está presente em poucos itens da dieta de muitas
pessoas, particularmente nos países em desenvolvimento, onde poderia ajudar
a reduzir deficiências crônicas de vitamina A.' Segundo o texto, a pesquisa
agrícola pode tirar pessoas da pobreza, ao aumentar os lucros e reduzir o
preço dos alimentos.
Dados da FAO revelam que mais de 70% das pessoas mais pobres do mundo vivem
em áreas rurais e dependem diretamente da agricultura para sua
sobrevivência. O relatório foi divulgado menos de uma semana depois de a
Monsanto ter desistido do lançamento de um trigo transgênico, sob a alegação
de que não havia aceitação por parte dos consumidores. Mas o documento da
FAO sustenta que, embora muitos europeus se oponham aos organismos
geneticamente modificados, o mesmo não corre entre os consumidores dos
países em desenvolvimento. Embora frise que pouco se conhece sobre os
efeitos a longo-prazo da ingestão de transgênicos, o texto sustenta que 'os
cientistas em geral concordam que os atuais cultivos transgênicos e os
alimentos derivados deles são seguros para comer'.
Vantagens e perigos. Benefícios potenciais dos transgênicos
O aumento da produtividade é um dos maiores benefícios já constatados dos
transgênicos. Cultivos modificados geneticamente para serem resistentes a
herbicidas e pragas já estão sendo plantados em diversos países. A redução
do impacto ambiental de plantios que demandam menos agrotóxicos também é
apontada como uma grande vantagem, bem como a adaptação de cultivos a
diferentes condições ambientais.
Para os especialistas, um dos maiores benefícios dos transgênicos seria o
aumento dos valores nutricionais de diversos alimentos, caso do arroz
enriquecido com vitamina A.
Riscos em potencial
O controle dos cultivos transgênicos ainda não é totalmente eficiente,
segundo a ONU. Um milho geneticamente modificado destinado a consumo animal,
por exemplo, foi encontrado em alimentos para humanos em 2000. A
transferência de substâncias passíveis de causar alergias em humanos é outra
preocupação dos cientistas. Plantas geneticamente modificadas podem ter
efeitos não desejados também para o produtor, como retirar mais recursos do
solo do que o normal ou demandar mais água.
Teme-se ainda que organismos transgênicos possam levar à redução de
populações naturais, causando desequilíbrio.
Vegetais com ômega 3 e 6
Cientistas da Universidade de Bristol, Grã-Bretanha, desenvolveram planta
transgênica capaz de produzir os óleos ômega 3 e 6, considerados benéficos
ao coração e normalmente encontrados apenas em peixes de águas mais frias,
como o salmão e o atum.
Para os pesquisadores, o estudo pode levar a uma nova geração de alimentos
especialmente criados para reduzir o risco de doenças cardíacas, entre
outros problemas de saúde. O estudo, publicado na 'Nature Biotechnology',
lembra ainda que, com a redução dos estoques naturais de peixes, a produção
desses óleos em outros organismos pode ser essencial para a alimentação
humana.
Segundo os cientistas, os genes utilizados para induzir a produção dos óleos
podem, em tese, ser usados em diversos vegetais, normalmente consumidos pelo
homem.
Fonte: JC e-mail 2526, de 18 de Maio de 2004 (O Globo, 18/5)
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