
Vegetal na dieta não evita tumor, diz estudo
Pesquisa européia com 285
mil mulheres conclui que consumo de fruta e verdura não protege contra câncer de
mama
Salvador Nogueira
Contrariando estudos anteriores, a maior pesquisa do gênero
já feita concluiu: não há indício de que o consumo de frutas e verduras reduza o
risco de câncer de mama. O estudo, europeu, foi conduzido com 285.526 mulheres
com idade entre 25 e 70 anos. Em compensação, uma outra pesquisa, feita nos EUA
com 148.610 adultos entre os 50 e os 74 anos de idade, confirmou que o consumo
de carne vermelha e carne em conserva leva a um risco aumentado de câncer de
cólon.
A pesquisa dos vegetais foi coordenada por Carla H. van Gils, do Centro Médico
Universitário de Utrecht, na Holanda, e contou com participantes de dez países
da Europa, indo de norte a sul, portanto abrangendo grande variedade de consumo
de vegetais.
Para coletar os dados, as mulheres tiveram de responder a um questionário sobre
hábitos alimentares no período 1992-1998 e, então, foram acompanhadas para que
se verificasse a incidência de câncer no grupo até 2002.
Já o estudo dos riscos aumentados da carne -que segue o resultado típico de
outros realizados anteriormente com metodologia semelhante- foi feito em 21
Estados dos EUA e coordenado por Ann Chao, da Sociedade Americana de Câncer, em
Atlanta.
Os resultados dos dois estudos, e de um terceiro que aponta que níveis elevados
de glicose e diabetes são fatores de risco para vários tipos de tumor, saem hoje
na revista da Associação Médica Americana (http://www.jama.com).
O resultado mais impressionante veio da pesquisa européia. Segundo Walter
Willett, pesquisador da Escola de Saúde Pública de Harvard, em Boston (EUA), que
assina um editorial na mesma edição do "Jama" para discutir as descobertas, as
conclusões vêm de "estudos prospectivos grandes e bem conduzidos", que
acompanham outros avanços no campo.
"Em relatório recente combinando dois grupos grandes, nenhuma relação foi
observada entre o consumo total de frutas e verduras e a incidência geral de
câncer." Os pesquisadores que conduziram o estudo são categóricos. "Apesar de o
período de acompanhamento ser limitado até o momento, os resultados sugerem que
o consumo geral ou específico de verduras e frutas não está associado a
[variações no] risco de câncer de mama", escreveram os autores europeus.
Os resultados fazem parte de um projeto europeu ainda mais abrangente de estudo
de câncer, que conta com quase 520 mil voluntários inscritos e é financiado por
diversas instituições públicas ligadas à saúde na UE.
Lacunas
Apesar de a metodologia dos estudos ser adequada, os resultados podem ser
influenciados por fatores aos quais as pesquisas não dizem respeito e levar a
conclusões precipitadas, afirmam alguns médicos. "Esses estudos epidemiológicos
não levam em conta outros fatores que podem ser determinantes", diz Agnaldo
Anelli, um oncologista clínico de SP.
Ele adverte: "Eu encararia os resultados com certa cautela. Eles não contam o
histórico genético, familiar, os fatores ambientais, efeitos de radiação
ionizante, várias coisas que sabidamente estão ligadas à ocorrência de câncer".
Alguns médicos também criticam a obtenção de respostas por meio de
questionários. E, segundo Antonio Frasson, do Hospital Albert Einstein e
professor da PUC (Universidade Pontifícia Católica) do Rio Grande do Sul, cinco
anos de acompanhamento é um tempo curto para avaliar o impacto da alimentação
nos riscos para câncer da mama.
"Ainda que tenham sido tomados vários cuidados metodológicos, é um estudo muito
complexo, que envolve pessoas com hábitos de vida e de alimentação muito
diferentes", diz Frasson. Para o mastologista José Luiz Bevilacqua, do hospital
Sírio Libanês, outros estudos menores já haviam demonstrado que não há impacto
significativo do tipo de alimentação em relação ao risco para câncer da mama.
"É um estudo importante pelo tamanho da população analisada. É bem desenhado e
bem controlado", diz. Porém, Anelli, Frasson e Bevilacqua reforçam que uma
alimentação rica em frutas, verduras e legumes é importante para a qualidade de
vida, prevenindo ou não o câncer, no que Willett concorda.
"Embora as descobertas possam ser decepcionantes, as reduções em pressão
sangüínea e a evidência epidemiológica para riscos menores de doenças
cardiovasculares oferecem razão suficiente para consumir esses alimentos em
abundância", escreve Willett.
Colaborou Cláudia Collucci, da Reportagem Local
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Fonte:
Folha de S. Paulo, 12/01/2005, reproduzido no JC e-mail 2686, de 12/01/2005.
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