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Hospital das Clínicas (HC) cria banco
de cérebros humanos. São mais de 800
.

Meta é traçar em dois anos o mais completo perfil de doenças
neurológicas de homens e mulheres com mais de 50 anos

Adriana Dias Lopes

Dá para imaginar uma sala com 800 cérebros? Cérebros humanos, vale dizer. Pois existe um pequeno lugar de cerca de 10 metros quadrados no casarão da Faculdade de Medicina do Hospital das Clínicas (FMSP-HC) que abriga, sim, até uma quantidade um pouco maior, em caixas de plástico. Trata-se do mega banco de cérebros que serve de base para o Projeto Envelhecimento Cerebral, do próprio HC.

A idéia é que, daqui a dois anos, os pesquisadores tenham o mais completo perfil epidemiológico já feito no planeta de doenças cerebrais em homens e mulheres com mais de 50 anos. ‘Queremos definir o momento exato de quando termina o envelhecimento e começam as doenças neurológicas. Ou, então, quando doenças como depressão, mal de Parkinson e de Alzheimer têm relação com a idade cronológica e como elas se manifestam no cérebro’, diz a patologista Lea Grinberg, uma das pesquisadoras do projeto.

A coleta dos cérebros começou em abril de 2004. O tempo é recorde. O banco da Holanda, por exemplo, um dos grandes, levou 20 anos para juntar mil. Os órgãos vêm do Serviço de Verificação de Óbitos, que concentra na capital autópsias de mortes naturais por causa mal definida.

O cérebro é separado do corpo no momento da autópsia. Isso é feito num intervalo de
4 a 12 horas depois da morte. O liquor – líquido que circula no cérebro e na medula e carrega substâncias importantes, como proteínas – é retirado e armazenado.

Depois, pedaços de áreas do cérebro usados em pesquisas genéticas são retirados e congelados na temperatura de -70º C. O que sobrou do órgão fica armazenado em formol por três semanas, na sala de 10 m2.

Novos fragmentos, então, são retirados de áreas específicas, onde as doenças cerebrais se manifestam ou há suspeita disso. Desses fragmentos são feitas lâminas com colorações para estudos microscópicos.

O critério de inclusão dos cérebros é que a pessoa tenha morrido com 50 anos ou mais. Estão fora aqueles que tiveram lesões muito graves, como derrame e traumatismo craniano, e aqueles que não tenham um familiar ou responsável para autorizar e fornecer dados do morto.

As informações são registradas em um longo questionário respondido pelo familiar mais próximo, no máximo uma semana depois da morte da pessoa.

As perguntas abordam temas relacionados à memória, capacidade de manusear objetos, de aprender, resolver problemas, hobbies e até a forma como era preparado o alimento consumido em casa.

‘O objetivo é que a médio prazo o banco de cérebros seja fonte para inúmeros trabalhos na medicina’, diz o geriatra José Marcelo Farfel, pesquisador do projeto. Por conta disso, a equipe fez parcerias com grandes instituições de saúde. Uma delas é o Ipen-USP, que vai analisar a influência de metais, como alumínio, nas demências.

Outra é o Laboratório do Projeto Genoma Humano da USP, que será responsável pela constituição do Banco de DNA dos corpos. Cerca de 500 questionários já foram analisados. Os pesquisadores constataram, por exemplo, que a maioria morreu de enfarte (31,4%).

A informação bate com índices mundiais. A surpresa até agora ficou por conta de que 40% tinham alterações nas funções cognitivas (memória, linguagem, capacidade de aprendizado).

‘Se pararmos para pensar que quando envelhecermos teremos 40% de chance de ter algum prejuízo da memória, por exemplo... Impressiona’, diz Fardel.  ‘Os parentes não sabiam que as alterações poderiam significar uma doença.’ Os dados serão comparados com estudos feitos nos órgãos. 

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Fonte: O Estado de S.Paulo, 12/3/05, reproduzida em JC e-mail 2725, de 14/03/2005