A atuação do Ministério Público na proteção
Este artigo
apresenta a atuação do Ministério Público na proteção dos direitos do idoso,
dando ênfase aos direitos consagrados na Constituição Introdução O presente artigo tem como objetivo destacar a atuação do Ministério Público na proteção dos direitos do idoso.[2] Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, o número de idosos poderá chegar a 32 milhões em 2025, gerando, assim, uma importante mudança no perfil da população, fato este que reforça a necessidade de ampliar os seus direitos e as formas para melhor protegê-los. Com transcorrer do tempo o ser humano passa a apresentar limitações físicas não dispondo mais do mesmo animo e disposição para enfrentar o cotidiano necessitando assim de cuidados especiais. Esta circunstância especial de vida torna o idoso uma pessoa frágil que necessita de uma atenção especial da família, da sociedade e do Estado para assegurar os seus direitos. O tema mostra-se relevante no contexto jurídico atual tendo vista o advento do Estatuto do Idoso (Lei n.º 10.741/03), que prevê novos direitos e instrumentos de proteção. Será abordada a proteção jurídica do idoso no ordenamento brasileiro, a atuação do Ministério Público, assim como os instrumentos utilizados para a proteção do idoso, como medida de proteção, ação civil pública e a transação de alimentos. A proteção jurídica do idoso no ordenamento brasileiro A Política Nacional do Idoso, instituída pela Lei n.º 8842/94 e regulamentada pelo Decreto n.º 1948/96, tem como objetivo assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade, nos termos de seu artigo 1º. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), em seu artigo 230, dispõe sobre a proteção da pessoa idosa, impondo a família, a sociedade e ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito a vida. Destaca Séguin (1999) que: “Incluir a proteção do idoso na CRF representou uma evolução, lançou luz sobre o tema e forçou o legislador infraconstitucional a manifestar-se.”. No presente momento, o Estatuto do Idoso, criado pela Lei n.º 10.741, de 01 de outubro de 2003,[3] estabelece prioridade absoluta as normas protetivas ao idoso, elecando novos direitos e estabelecendo mecanismos específicos de proteção. Os principais direitos do idoso encontram-se no artigo 3º do Estatuto, o qual preceitua que: Art. 3º. É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitário. Neste norte, explica Franco (2004), que: “A Lei fala em obrigação e não em faculdade que têm a família e as entidades públicas em assegurar esses direitos ao idoso. Se a família não tiver condições para socorrê-lo o poder público o substituirá dentro da sua possibilidade.”. A razão da repetição da CRFB/88, da Política Nacional do Idoso, da Lei Orgânica de Assistência Social (Lei n.º 8.742/93), da Política Estadual do Idoso (Lei n.º 11.436/00) e as Leis Orgânicas Municipais, é dar ênfase aos artigos que visam assegurar os direitos dos idosos. Finalmente, os cento e dezoitos artigos do Estatuto foram criados para por em prática as garantias dos direitos assegurados pela CFRB/88 e pelas políticas públicas de atenção ao idoso. A atuação do Ministério PúblicoAs funções conferidas ao Ministério Público para a defesa dos direitos e garantias constitucionais do idoso, por meio de medidas administrativas e judiciais, estão elencadas no artigo 129 da CRFB/88, na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei n.º 8.625/1993), assim como na Lei Orgânica do Ministério Público de Santa Catarina (Lei Complementar Estadual n.º 197/2000 ). Consta no Plano Geral de Atuação do Ministério Público de Santa Catarina de 2004-2005 (Ato n.º 074/MP/SC) como uma das atuações prioritárias na área da Cidadania a proteção dos direitos do idoso.[4] Diz Mazzilli (2004) que: ”Da mesma forma que um dia ocorreu com a defesa do meio ambiente, do consumidor, da pessoa portadora de deficiência, da criança e do adolescente, chega agora a vez do Ministério Público voltar sua atenção para a tutela jurídica das pessoas idosas.”. Encontram-se expressas no Estatuto do Idoso as atribuições conferidas ao órgão do Ministério Público, como a legitimidade para requer e determinar medidas de proteção, a fiscalização das entidades governamentais e não-governamentais de atendimento ao idoso, entre outras elencadas no artigo 74 do mesmo estatuto, conforme dispõe: Art. 74. Compete ao Ministério Público: I – instaurar o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos direitos e interesses difusos ou coletivos, individuais indisponíveis e individuais homogêneos do idoso; II – promover e acompanhar as ações de alimentos, de interdição total ou parcial, de designação de curador especial, em circunstâncias que justifiquem a medida e oficiar em todos os feitos em que se discutam os direitos de idosos em condições de risco; III – atuar como substituto processual do idoso em situação de risco, conforme o disposto no art. 43 desta Lei; IV – promover a revogação de instrumento procuratório do idoso, nas hipóteses previstas no art. 43 desta Lei, quando necessário ou o interesse público justificar; V – instaurar procedimento administrativo e, para instruí-lo: a) expedir notificações, colher depoimentos ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado da pessoa notificada, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar; b) requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades municipais, estaduais e federais, da administração direta e indireta, bem como promover inspeções e diligências investigatórias; c) requisitar informações e documentos particulares de instituições privadas; VI – instaurar sindicâncias, requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, para a apuração de ilícitos ou infrações às normas de proteção ao idoso; VII – zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados ao idoso, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis; VIII – inspecionar as entidades públicas e particulares de atendimento e os programas de que trata esta Lei, adotando de pronto as medidas administrativas ou judiciais necessárias à remoção de irregularidades porventura verificadas; IX – requisitar força policial, bem como a colaboração dos serviços de saúde, educacionais e de assistência social, públicos, para o desempenho de suas atribuições; X – referendar transações envolvendo interesses e direitos dos idosos previstos nesta Lei. § 1º A legitimação do Ministério Público para as ações cíveis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo dispuser a lei. § 2º As atribuições constantes deste artigo não excluem outras, desde que compatíveis com a finalidade e atribuições do Ministério Público. § 3º O representante do Ministério Público, no exercício de suas funções, terá livre acesso a toda entidade de atendimento ao idoso. Já nos processos, procedimentos que não for parte o Ministério Público atuará obrigatoriamente na defesa dos direitos e interesses da lei, ao contrário, deverá ser decretada a nulidade do feito. Ainda, havendo desistência ou abandono de ação civil pública por associação legitimada, o Ministério Público, deverá assumir a titularidade ativa. Medida de Proteção A teor do artigo 45 do Estatuto do Idoso o representante do Ministério Público ao verificar ameaças ou violações ao direito do idoso poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: o encaminhamento à família ou curador, mediante termo de responsabilidade; orientar, apoiar e acompanhar temporariamente; expedir requisições para tratamento de saúde; incluir em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a usuários dependentes de drogas, ao próprio idoso ou à pessoa de sua convivência que lhe cause perturbação; abrigar em entidade ou abrigar temporariamente. Logo, este instrumento de proteção facilita o acesso à justiça na medida em que os direitos podem ser garantidos de forma pronta e ágil sem a necessidade e os entraves burocráticos do processo judicial. Ação Civil Pública A Lei n.º 7.347/85, trata sobre a Ação Civil Pública, a qual também é encontrada no artigo 129 da CRFB/88. Esta ação visa proteger, dentre outros, os interesses difusos, coletivos, individuais indisponíveis ou homogêneos. Após a criação da Lei de Ação Civil Pública houve a valorização do Ministério Público quanto a atuação nos interesses difusos e coletivos. Neste contexto, escreve Abreu Filho e Abreu de Figueiredo e Silva (2004) que “a Ação Civil Pública consagrou uma instituição, o Ministério Público, valorizando seu papel de autor em prol dos interesses difusos e coletivos. O Ministério Público saiu do exclusivismo das funções de autor no campo criminal e da tarefa de fiscal da lei no terreno cível, para nesta esfera passar a exercer mister de magnitude social”. O Ministério Público deverá estar presente como autor ou interveniente, em qualquer ação civil pública quando o assunto versar sobre interesses difusos ou coletivos dos idosos, a teor dos artigos 127, caput, e 129, II e III da CRFB/88, no inciso III do artigo 82 do Código de Processo Civil, e no artigo 1º, IV, da Lei de Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85). De acordo com o Estatuto do Idoso possui legitimidade ativa para propor a Ação Civil Pública, quanto o assunto versar sobre a defesa do interesse do idoso, dentre outros, o Ministério Público. Transação de Alimentos Os alimentos serão prestados ao idoso, na forma dos artigos 1.694 a 1.710 do Código Civil e do artigo 1.120, V do Código de Processo Civil. O Promotor de Justiça poderá celebrar as transações relativas a alimentos, ocasião em que elaborará um termo de compromisso que será assinados por ele e pelas partes, que passará a ter efeito de título executivo extrajudicial. Não tendo condições econômicas, o idoso ou seus familiares, de promover o seu sustento, será imposto ao Poder Público esse ônus, no âmbito da assistência social, a teor do que dispõe o artigo 14 do Estatuto do Idoso. Fiscalização das Entidades O Estatuto do Idoso criou um capítulo específico quanto a Fiscalização das Entidades de Atendimento, determinando que as entidades governamentais e não- governamentais de atendimento as pessoas idosas serão fiscalizadas pelos Conselhos do Idoso, Ministério Público, Vigilância Sanitária e dentre outros. A entidade que causar infração, colocando em risco os direitos assegurados pelo Estatuto, será o fato comunicado ao Ministério Público para tomar as providências cabíveis, assim como este órgão poderá promover, sem a necessidade de processo judicial, a suspensão das atividades ou dissolução da entidade, com a proibição de atendimento aos idosos a bem do interesse público. Contudo, antes da publicação do Estatuto do Idoso, já vinha atuando o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, através do Programa de Vistoria a Entidades Asilares:[5] Com o intuito de facilitar o cumprimento desta atribuição legal, a Coordenadoria de Defesa dos Direitos Humanos, da Cidadania e das Fundações criou um cadastro de entidades asilares situadas no Estado de Santa Catarina, bem como, elaborou este programa de vistoria a ditos estabelecimentos, objetivando que o Ministério Público, agindo articuladamente com outros organismos e instituições, tais como Corpo de Bombeiros, Vigilância Sanitária, Secretarias de Estado e Municipais, Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, Conselhos Estadual e Municipais do Idoso e os Conselhos Estadual e Municipais de Assistência Social, possa contribuir com o bem estar dos idosos do nosso Estado. Pelo exposto, verifica-se que a fiscalização dos estabelecimentos que abrigam os idosos em regime asilar, é uma das mais importantes atribuições do Ministério Público, haja vista a condição especial de vida dos idosos, os quais, além das mais variadas privações próprias da idade ainda encontram-se, geralmente, desamparados de seus familiares e impedidos de exercer plenamente os direitos referentes à cidadania. Conclusão A proteção jurídica dos direitos do idoso no Brasil, inicialmente encontra-se consagrada na CRFB/88, bem como na Política Nacional do Idoso (Lei n.º 8842/94), na Lei Orgânica de Assistência Social (Lei n.º 8.742/93), na Política Estadual do Idoso (Lei n.º 11.436/00), nas Leis Orgânicas Municipais e, atualmente, no Estatuto do Idoso (Lei n.º 10.741/03), que estabelece prioridade absoluta aos direitos do idoso, dispondo de instrumentos de proteção a estes direitos. A função do Ministério Público na proteção dos direitos do idoso é imposta, primeiramente, pela CFRB, devendo para tanto, o Ministério Público de cada cidade atuar com prioridade em defesa dos direitos do idoso, assim como está fazendo o Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Dentre outras atribuições expressas no Estatuto do Idoso, foram destacadas: determinação de medida de proteção, legitimação para a ação civil pública, fiscalização das entidades e a celebração da transação de alimentos. A Medida de Proteção, é um instrumento que permite ao Ministério Público dar agilidade aos casos que muitas vezes não podem esperar até a apreciação judicial. O Ministério Público possui legitimidade conferida pela CRFB/88 para propor Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85), bem como praticar todos os atos necessários a garantia dos interesses difusos ou coletivos dos idosos. A transação de alimentos poderá ser referendada pelo Promotor de Justiça, a qual terá efeito de título executivo extrajudicial. A fiscalização dos estabelecimentos que abrigam os idosos em regime asilar, é uma das mais importantes atribuições do Ministério Público, já que deve ser observada a condição especial de vida o idoso como pessoa frágil. Contudo, pode-se ainda destacar que a maioria dos idosos ainda não descobriu que são os atores principais para a efetivação de seus direitos e para que isto aconteça é fundamental a conscientização tanto dos operadores jurídicos da sua importância, como também dos próprios idosos, os quais precisam conhecer seus direitos para exercê-los e reivindicá-los. Referências ABREU FILHO, Hélio; SILVA, Franciny B. Abreu de Figueiredo e. Mecanismos de Exigibilidade. In: ABREU FILHO, Hélio (Org.). Estatuto do Idoso Comentários. Florianópolis: [s.n.], 2004. p. 19-37. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: 1988 – texto constitucional de n. 1, de 1992, a 30, de 00, e pela Emendas Constitucionais de Revisão de n. 1 a 6, de 1994 – Brasília, DF: Senado, 2000. BRASIL. Lei n.º 8.842 de 04 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a política nacional do idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências. Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br/legisla/fed_leidec/lei_federal/1994/lf8842_94.htm>. Acesso em: 26 abril 2004 BRASIL. Lei n.º 10.741 de 01 de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Disponível em: <http:\\www.mp.sc.gov.br/legisla/fed_leidec/lei_federal/2003/lf10741.htm>. Acesso em: 26 abril 2004. FRANCO, Paulo Alves. Estatuto do Idoso Anotado. São Paulo: LED, 2004. 169 p. MAZZILLI, Hugo Nigro. A Pessoa Idosa e o Ministério Público. Disponível em: <http://www.femperj.org.br/artigos/prev/prev02.htm>. Acesso em: 12 julho 2004. PIARDI, Sonia Maria Demeda (Coord.). Programa de Vistoria a Entidades Asilares. Florianópolis: MP-SC, 2003. 83 p. SEGUIN, Elida. Proteção Legal ao Idoso. In: SEGUIN, Elida (Org.). O Direito do Idoso. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999. p. 1-42. * Este artigo, que teve como co-orientadora Maria de Lourdes Alves Lima Zanatta, está publicado nas páginas 235-244, dos Anais da Semana de Divulgação Científica do Curso de Direito. Itajaí: Univali, 2004. 390p. [1]Acadêmica do oitavo período de Direito da UNIVALI, estagiária do Ministério Público e educadora social, lotada no Departamento de Atenção ao Idoso – Prefeitura Municipal de Itajaí (SC). [2] Considera-se idoso, para efeitos da Lei n. 10.741/03, pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. [3] Esta lei entrou em vigor noventa dias após a data de sua publicação, exceto o artigo 36, o qual trata sobre a caracterização de dependência econômica, que passou a vigorar no dia primeiro de janeiro deste ano. [4] O item 7.3 que trata da tutela do idoso, assim dispõe: “Dar continuidade às ações já desencadeadas, visando a zelar pela correta aplicação das normas relativas ao idoso, evitando a ocorrência de abusos e lesões a seus direitos e contribuindo com o seu bem-estar, especialmente por meio de vistorias em entidades asilares e de ações articuladas com outros organismos e instituições.” [5] Sonia Maria Demeda (Coord.). Programa de Vistoria a Entidades Asilares. Florianópolis: MP-SC, 2003. |