Identidade, aposentadoria e o processo de envelhecimento A questão do envelhecimento vem ganhando representatividade visto o prolongamento da expectativa de vida da população e conseqüente crescimento do número de idosos em todo o mundo. O limite cronológico proposto pela ONU, em 1982, para início da chamada terceira idade, tomou por base a média de idade da aposentadoria estabelecida na maioria dos países. Tal limite proposto induz à associação corrente entre velhice e aposentadoria, que embora na prática nem sempre se confudam. Enquanto associadas remetem a uma representação coletiva em que o velho é percebido como não mais produtor de bens e serviços e, portanto, marginalizado nos contextos sociais pautados pelo valor produtivo. A importância e a exaltação máximas conferidas ao trabalho nas sociedades contemporâneas concedem ao papel de trabalhador um lugar de destaque entre os papéis sociais representativos do eu. Hana Arendt, referindo-se a importância do homo faber no mundo contemporâneo, assinala que ao tentar dizer quem é, a própria linguagem induz a dizer o que alguém é, reservando um lugar de destaque ao papel de trabalhador e lhe conferindo valor social. Da importância conferida à identidade de trabalhador emergem questões referentes à aposentadoria pois, na língua portuguesa, o vocábulo aposentadoria remete, etimologicamente, à noção de recolhimento ao interior da habitação, dos aposentos. No entanto, nem sempre a aposentadoria representa um rompimento com o mundo do trabalho pois, no Brasil, pressões econômicas, sociais e culturais concorrem para a permanência no mercado, implicando ou não em alterações no local de trabalho, no tipo de atividade, no ritmo e na jornada. O que se constata é a ocorrência de uma "dupla aposentadoria" no plano subjetivo: a primeira legal, por tempo de serviço e a segunda, nem sempre com reconhecimento oficial, mas determinada, em geral, pelos limites impostos pelo corpo (doença e/ou idade) e pelo processo de exclusão do mundo do trabalho. A aposentadoria burocrática e formal muitas vezes se configura como um espaço de preparação subjetivo para o afastamento futuro, com valor simbólico, pois coloca para o trabalhador a possibilidade real de um mundo do não trabalho. Essa preparação consiste em uma reorganização da vida familiar, novas relações afetivas, novos espaços de convívio e de relacionamento fora do mundo do trabalho, novas rotinas e até a diminuição gradativa da jornada laboral. Surgem os trabalhos alternativos, os hobbies, as experiências em artes e ofícios que implicam em autonomia com relação à organização do trabalho. A aposentadoria ganha, concretamente o significado de ausência do trabalho a medida que aumenta a idade cronológica e quando o fator doença se apresenta associado. No entanto, o vínculo simbólico com o trabalho permanece através da identidade de trabalhador que se mantém como referência identitária pois não se rompem os modelos de identificação preservados pela memória e expressos pelo sufixo "ex" quando da identificação para dizer quem é, o que faz. Todas essas considerações ensejam para um novo olhar sobre o envelhecimento com base em estudos e pesquisas de caráter interdisciplinar e na proposição de políticas públicas voltadas a essa população.
Fonte: Núcleo de Informação
do Idoso |