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Qual o significado da ocupação para pessoas
Por Beltrina Côrte - pesquisadora mentora
“... o fato de que o homem é
capaz de agir significa que se pode esperar dele o inesperado, que ele é capaz
de realizar o infinitamente improvável... isto, por sua vez, só é possível
porque cada homem é singular”.
O fato de a faixa etária de pessoas com mais de 75 anos ser a que mais cresce no nos leva a refletir sobre como vai ser nosso envelhecimento. Pesquisas recentes apontam que a ocupação, tanto econômica quanto prazerosa, é necessária. Um estudo do Sesc feito com mil cento e oito pessoas acima de 55 anos assinala a importância da freqüência do lazer. Do total dos pesquisados, 57% falam do interesse em ter uma ocupação, associando-a a atividades emotivas. O trabalho voluntário, muito apontado, minimiza a morte social dos idosos, altera o quadro de depressão e ameniza a relação familiar. Esses e outros dados foram discutidos no Núcleo de Estudo e Pesquisa do Envelhecimento (Nepe) da PUC-SP, no dia 30 de março.
Segundo José Bernardo Enéias de Oliveira, psicólogo e um dos organizadores do evento, dados do IBGE (2004) mostram que existem no Brasil quatro milhões oitocentos e setenta mil trezentos e trinta e seis idosos ocupados, representando 30,4%, do total de idosos existentes no país (pouco mais de dezesseis milhões). O evento, intitulado Qual o significado da ocupação para pessoas acima de 75 anos?, contou com depoimentos e apresentação de um filme-documentário elaborado pelos próprios organizadores e que foi baseado em perguntas sobre a ocupação a pessoas acima de 75 anos, algumas com atividade remunerada, outras apenas por prazer. O jornalista Roberto Esteves, a partir do olhar da fotografia, relatou a experiência da oficina que ministrou sobre fotografia a idosos de São Paulo. Idosos que pegam suas fotos antigas, elaboram sua ontologia, aprendem a fotografar, revelar, expor e até a encontrar outra ocupação após tantos anos de vida, além, é claro, da inclusão, dada com a câmera na mão.
O jornalista contou o caso de uma senhora que resolveu fotografar os motoristas de transporte coletivo que paravam no ponto quando apenas estava ela, prática não usual por muitos outros motoristas. Mas a senhora resolveu também fotografar aqueles que não paravam e a mostrar para os demais usuários daquele transporte as fotos, apontando os que paravam e os que seguiam em frente. A foto, então, era utilizada como reivindicação. Em pouco tempo, todos estavam parando. Ela inclusive foi convidada a fotografar uma festa da organização daquele transporte coletivo. Em outro caso, ele relata a história de um taxista que passou a fotografar seu ambiente de trabalho. A vizinhança começou a pedir que ele fotografasse batizados, festas, casamentos... Há ainda a história de um senhor que era conhecido no bairro como “Tiozinho” e que, após aprender a fotografar, começou a registrar em imagens o cotidiano do bairro, fato que o incluiu na comunidade, que passou a chamá-lo, então, “Sr. Luís”. Esses casos, diz o jornalista, revelam que a fotografia, além de devolver a cidadania ao idoso, também dá a possibilidade de criarem situações de trabalho. Nesse sentido, ele aponta a diversidade da fotografia: paisagem, esportiva, jornalística, convencional, casamento, acontecimento de rua, etc. O evento também contou com a participação de José Inácio de Oliveira, diretor Social do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, que, além de relatar sua experiência pessoal de recém-casado e trabalhador remunerado aos 77 anos, apontou a desvalorização, a exclusão e as diversas barreiras que a maioria dos idosos devem enfrentar, lamentando que a experiência não seja levada em conta nesta sociedade: “nem valores, nem conhecimentos e nem reconhecimentos”.
Para Suzana Medeiros, 78 anos, coordenadora do Programa de Gerontologia da PUC-SP, o trabalho faz parte de sua construção. Suzana conta: “Na minha trajetória, que já é longa, vejo que o trabalho esteve presente desde os meus 17 anos. Hoje, penso que fui privilegiada quando, na década de 80 do século passado, fui forçada a estudar o envelhecimento quando eu justamente começava a envelhecer”. Esse fato foi, para a professora Suzana, essencial para ter uma melhor compreensão sobre a velhice e também para suportar as perdas, inerentes a essa etapa da vida.
Suzana pontua a necessidade da população obter informações. Como a velhice é uma etapa da vida, o nascer, crescer e morrer são, portanto, acontecimentos naturais. Como eles se dão, diz ela, tem a ver com a cultura que nos formamos. Segundo a professora, para exercer uma profissão é necessário fazer um curso. Mas, diz, “não estudamos para viver, e vivemos sem pensar o que é o viver. De repente, o homem recebe de presente a longevidade, mas o que fazer com ela? Que sentido tem esse tempo do envelhecer quando a juventude, hoje, deixou de ser uma etapa da vida para ser um objeto de desejo?” A professora confessa: “Ao estudar o envelhecimento, compreendi essas dificuldades e me beneficiei com isso. Penso que envelheci bem e me achando com significado”. Suzana considera importante que o idoso tenha informações para que saiba que essa etapa da vida seja um tempo que ainda possa realizar seus sonhos, outras atividades, outras ocupações, um outro jeito de viver. Suzana conclui dizendo que “se tem que reinventar a vida a cada dia com as aquisições que se recebe e com as perdas”.
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