Desprezo pelo povo Apesar da implementação da Lei
Orgânica de Assistência Social, gastos Por Luciano Rodrigues A Constituição assegura a todos os brasileiros o direito à assistência social. A regulamentação desse compromisso do Estado com a população desfavorecida data de 1993, quando foi implementada a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas). Os recursos destinados pelos governos para a garantia desse direito, no entanto, não acompanharam a evolução legislativa sobre o tema na última década, excluindo dos programas sociais a maior parte dos beneficiários em potencial. Em comparação com a política econômica, a política social ainda ocupa posição secundária nas prioridades dos governos. As duas gestões do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, deixaram muito a desejar nesse aspecto. Entre 1995 e 2002, o Estado não apenas reduziu a abrangência dos programas sociais anteriores como deixou de executar as ações previstas na Loas. É o que mostra um estudo feito pela professora Ivanete Boschetti, do Departamento de Serviço Social da Universidade de Brasília (UnB). Sua análise inédita está documentada no livro Assistência Social no Brasil: um direito entre originalidade e conservadorismo (2003). Do total das verbas destinadas à Seguridade Social - que além da assistência inclui recursos para a Saúde e para a Previdência -, pelo menos 5% deveriam ter sido destinados à assistência social. Nos oito anos dos dois governos de FHC, no entanto, esse valor não chegou a 3%. Em crescimento constante, o percentual orçamentário para a assistência social variou de 0,68%, em 1996, a 2,57%, em 2002. Por haver assumido o comando do país logo após a implementação da Lei Orgânica, Fernando Henrique Cardoso foi obrigado a reorganizar as ações de assistência social. "Esse período representou um avanço enorme, porque foram implementados novos programas sociais em respeito às Loas", destaca a professora Ivanete Boschetti. Ele explica que, além dos três benefícios prestados desde o governo de Getúlio Vargas na área de assistência social - creche para crianças de 0 a seis anos, Serviço de Ação Continuada (SAC) para Pessoas Portadoras de Deficiência e o Serviço de Ação Continuada para Idosos -, foram instituídos três novos programas. São eles: o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti); o Agente Jovem, para adolescentes entre 13 e 16 anos; e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) para portadores de deficiência e para idosos com mais de 67 anos. No final do governo, entre 2001 e 2002, Fernando Henrique criou os programas Auxílio Gás, o Bolsa-Escola e o Bolsa Alimentação. Ao analisar o funcionamento de todos esses programas na gestão de FHC - inclusive o número de pessoas atendidas e os recursos aplicados -, a pesquisadora constatou que, apesar da ampliação dos benefícios de ano em ano, a assistência social chegou a uma parcela mínima das pessoas que teriam direito por sua condição de pobreza. "Durante todos os anos do governo de Fernando Henrique, os atendimentos foram muito residuais", observa Ivanete. No último ano do governo tucano, quando os índices de atendimento social apresentaram os melhores resultados, por exemplo, as creches brasileiras atendiam somente a 16% da demanda, que correspondia a 10,1 milhões de crianças com idades até seis anos e cujos rendimentos familiares estavam abaixo de meio salário mínimo per capita. Considerando o mesmo período, do total de três milhões de portadores de deficiência com renda familiar inferior a meio salário mínimo por pessoa e que deveriam receber auxílio do Estado, somente 4,96% foram contemplados com o programa. E dos 1,6 milhão de idosos em condição semelhante, 18,59% contaram com a assistência do governo. Com relação aos programas implementados durante a gestão FHC, o dados não são melhores. De um total de 3,5 milhões de jovens entre 15 e 17 anos com renda familiar per capita de até meio salário mínimo, apenas 0,97% foram atendidos pelo projeto Agente Jovem no último ano do governo passado. Cerca de 30% dos 2,6 milhões de crianças trabalhadoras foram beneficiadas pelo Peti. Esse programa oferecia bolsas para que crianças entre sete e 14 anos deixassem de trabalhar e se dedicassem exclusivamente aos estudos. As famílias residentes nas cidades recebiam R$ 45 e as que moram no campo, R$ 25 ao mês. Com índices mais elevados, os BPCs voltados para deficientes físicos e para o idoso beneficiaram com o pagamento de um salário mínimo respectivamente a 32,23% e 75,22% dos brasileiros que teriam direito a participar do programa, ao final do governo de Fernando Henrique. Segundo a pesquisadora, esses índices são mais elevados por representarem direitos constitucionais brasileiros. "Caso o benefício não chegue, o governo pode ser processado pelo cidadão na Justiça", afirma. ________________________________
Fonte: Planalto Central - 31/05/2005. |