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Aprender uma língua estrangeira na velhice

Por  Elizabeth Thomaz Pereira - Pesquisadora Mentora
thor@iconet.com.br

O aumento da população idosa se deve não à maior expectativa de vida gerada pela melhoria das condições sociais e sanitárias, mas também à diminuição da taxa de natalidade. Hoje, há um franco predomínio de adultos e idosos nos países desenvolvidos e também nos em vias de desenvolvimento.

A sociedade contemporânea tende a idealizar a juventude e tudo o que considera novo, rejeitando, como conseqüência, o idoso e tudo o que considera velho. Esta segregação leva os idosos a uma morte social, uma vez que se transformaram em seres descartáveis, relegados à solidão. A privação de uma atividade ocupacional e a condenação à passividade constituíram-se em uma verdadeira exclusão social, da mesma forma que as atividades prazerosas e agradáveis da vida diminuíram.

Os idosos são muito diferentes uns dos outros, ainda que pertençam à mesma cultura. Nem todos ficam passivos ou despendem o seu tempo em jogos de cartas, porém são desafiados a   buscar outras possibilidades.  O “novo velho” fez cair por terra o mito de que o velho não aprende e não muda, determinado pelo maior acesso à informação que  garantiu novos aprendizados, a quebra de alguns preconceitos e a alteração no comportamento.

O aprendizado de uma língua estrangeira deixou de ser uma impossibilidade para indivíduos mais velhos, tanto é que muitos buscam esses cursos. Perceber quais são os significados, para os idosos, da aprendizagem de uma língua estrangeira nessa etapa da vida é muito importante, especialmente conhecer o perfil, identificar as concepções de envelhecimento e investigar o significado para o sujeito da aprendizagem de uma outra língua.

Foram selecionados sete aprendizes de língua estrangeira, todos na faixa etária entre 65 e 75 anos de idade, assim divididos: um de Italiano, um de Francês e cinco de Esperanto. Dentre os entrevistados, quatro eram homens e três, mulheres, moradores do Estado de São Paulo, Brasil (seis habitantes da cidade de Lorena, interior do estado e um da capital). Dos sete entrevistados, cinco fazem parte de instituição pública municipal de Lorena e o estudante de Italiano paga uma mensalidade um pouco superior a 5% do salário mínimo vigente, para ter aulas durante duas horas, uma vez por semana, sempre no mesmo dia e horário. Os alunos de Esperanto têm aulas gratuitas e a entrevistada que estuda francês, o faz em São Paulo, num curso financiado pela prefeitura da capital.

As entrevistas tiveram a duração média de 41 minutos, foram gravadas com consentimento e, posteriormente, transcritas na íntegra. Três dos entrevistados foram contatados em suas residências em dia e horário por eles determinados. Outros três depoimentos se realizaram no local onde são ministrados os cursos regulares, no horário que precedia a aula, em dias previamente escolhidos de comum acordo entre entrevistado-entrevistador. A última entrevistada aceitou comparecer à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo para dar o seu depoimento, uma vez que reside nas proximidades da instituição. Neste caso, a entrevista foi feita numa sala de aula disponível.

A metodologia escolhida pela pesquisadora foi a pesquisa com abordagem qualitativa, uma vez que ela é importante paracompreender valores culturais e as representações de determinado grupo sobre temas específicos” (Minayo, 2000). Para tanto foi elaborado um roteiro com perguntas parcialmente estruturadas, do qual constaram perguntas abertas preparadas antecipadamente, feitas verbalmente. Apesar dos temas terem sido particularizados, a entrevistadora pôde acrescentar perguntas extras de esclarecimento, além de ter tido plena liberdade quanto à retirada eventual de algumas perguntas e à ordem em que elas foram colocadas. Este roteiro foi usado pela pesquisadora numa entrevista-piloto para que fossem feitos determinados ajustes e se alcançassem os objetivos propostos.

Foto: Jorge Felippe da Cruz Filho: "Os meus relacionamentos frutos desse aprendizado, dilatou o meu círculo de amizades. E tem também o prazer, que eu sinto ao falar Espanhol."

Com o termo de consentimento assinado previamente pelos entrevistados e a permissão para utilização dos relatos, está sendo feita a interpretação das respostas a fim de classificá-las por categorias, conservando o aspecto confidencial da identificação dos participantes. Algumas estão definidas, como: os domínios da idade psicológica, o bem-estar subjetivo, a experiência anterior e atual como aprendiz de língua estrangeira, os hábitos da vida diária e as expectativas dos sujeitos de pesquisa. Outras poderão surgir a partir da análise dos depoimentos.

Pesquisadores como Baltes (1980), Labouvie (1974) e Schaie (1981) afirmam que não se pode falar de um declínio geral que afete todas as funções durante o envelhecimento, nem que o envelhecimento seja um fenômeno universal que envolva todas as pessoas. Ele é um processo individual, com amplas oscilações intra-individuais e interindividuais das funções biológicas e psíquicas.

Nesse período do envelhecimento, é fundamental manter as faculdades intelectuais por meio de estímulos. A capacidade de aprender não desaparece se os idosos não se fecharem à realidade e a novas experiências (Griffa, 2001).  Viktor Frankl (1968) afirma que não existe na vida nenhuma situação sem sentido. Os aspectos da existência humana podem, com a disposição e a atitude adequadas, serem transformados quando se encontra uma razão.

Refletir sobre o aprendizado de uma língua estrangeira é pensar sobre educação, e com isso, incrementar a capacidade do indivíduo para realizar as suas próprias escolhas. É refletir sobre o próprio sentido da existência humana, reexaminando as premissas básicas que nos conduziram até onde estamos. Nesta perspectiva, a longevidade entendida no seu sentido amplo de condição humana pode ser considerada um processo pelo qual se redefinem os modos de ser e de significar a existência, ao mesmo tempo em que se redesenham as relações de trocas sociais e afetivas.

Referências

BALTES, Paul B. & ORVILLE, G. Brim. Life-span development and behavior. New York, Academic Press, 1980. v. III.

FRANKL, Viktor E. The Task of education in an age of meannglessness. Letter, S. S. Ed., Institute of Higher Education. New York, Columbia University, Teachers College Press, 1968.

GRIFFA, Maria Cristina & MORENO, José Eduardo. Chaves para a Psicologia do Desenvolvimento: Adolescência, Vida Adulta, Velhice. São Paulo, Paulinas, 2001, p.p. 95-111.

LABOUVIE-VIEF, G.; HOYER, W. J. e BALTES, M. M. e BALTES, P. M. Operant analysis of intellectual behavior in old age: Human Development, 17, pp. 259-272.

LOPES, Ruth da G. C. As interpretações sociais da saúde na velhice, refletidas no uso de medicamento. Tese de Doutorado. Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

MEDEIROS, Suzana A. da Rocha e CÔRTE, Beltrina. “Editorial”.In: Revista Kairós. V. 5 –n. 2, pp. 11-16. São Paulo: EDUC, 2002.

MINAYO, M. Cecília de Souza. “A entrevista. In: O desafio do conhecimento-pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo, Hucitec/ Abrasco, 2000, pp. 107-125 e 131-135.

SCHAIE, K. W. Psichological changes from midlife to early old age: implications for the maintenance of mental health. American Journal of Orthopychiatry, 51, 1981, pp.199-218.